Na década de 90 do século XX, o uso medicinal da cannabis ganhou um novo interesse na comunidade científica mundial após a descoberta do Sistema Endocanabinoide e seus receptores celulares CB1 e CB2. A ativação e/ou bloqueio destes receptores, existentes nas células dos mais variados sistemas biológicos, pelos canabinoides (THC, CBD, dentre outros mais de 70 canabinoides) produzem efeitos biológicos que podem trazer alívio e controle para uma série expressiva de doenças crônicas ligadas ao sistema nervoso e sistema imune.
Segundo pesquisa realizada no PubMed.gov, maior portal de pesquisas científicas do mundo, desde 1994 até hoje, 18.200 artigos científicos foram publicados por vários grupos de pesquisa de respeitadas universidades mundiais demonstrando o poder medicinal da cannabis e seus diferentes compostos, sendo os principais o canabidiol (CDB) e tetra-hidrocanabinol (THC). Para muitos casos de epilepsia refratária, síndrome de Tourette, síndrome de Huntington e esclerose múltipla a cannabis é o único remédio.
O recente relatório, Os Efeitos da Cannabis e dos Canabinoides na Saúde: Cannabis e Canabinoides, os Efeitos na Saúde: Estado Atual de Evidências e Recomendações para Pesquisa, publicado em janeiro de 2017 pela Academia Americana de Ciências, Medicina e Engenharia, concluiu que há evidências substanciais de que a cannabis é efetiva para o tratamento de dor crônica em adultos, no tratamento dos efeitos colaterais de quimioterapia e para espasmos em pacientes de esclerose múltipla.
No âmbito nacional, em janeiro a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou o registro do medicamento específico Mevatyl®, com canabinoides (tetraidrocanabinol (THC), 27 mg/ml + canabidiol (CBD), 25 mg/ml), obtidos a partir da cannabis sativa, na forma farmacêutica solução oral (spray). É o primeiro medicamento registrado no país à base de cannabis sativa.
Diversos avanços têm sido feitos no campo do reconhecimento da cannabis como remédio, tais como a concessão de autorizações de plantio, individuais e coletivas, além de diversas ações, por parte de diferentes instituições, no sentido de regular o plantio e comércio de cannabis medicinal no Brasil. Dentre essas, devemos destacar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5708, proposta pelo Partido Popular Socialista (PPS) no STF, dia 19/05, com pedido de medida cautelar, questionando a proibição da cannabis para fins medicinais e de bem-estar terapêutico no Brasil. A ação conta com a participação e apoio técnico da AMA+ME, através do advogado constitucionalista e seu coordenador jurídico, Dr. Maurício Sullivan Balhe Guedes. A ADI confronta dispositivos da Lei n. 11.343/06 (lei de entorpecentes) e pede que “seja concedida medida cautelar em caráter de urgência para assegurar o plantio, cultivo, colheita, guarda, transporte, prescrição, ministração e aquisição de cannabis para fins medicinais e de bem-estar terapêutico”.
Dessa forma, a AMA+ME recebeu com surpresa a nota na qual Conselho Federal de Medicina (CFM) e Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), manifestam seu desacordo e pedem a revogação da decisão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que incluiu, na Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) n° 156, em 5 de maio de 2017, a Cannabis sativa L (maconha), em sua relação de plantas de interesse da indústria farmacêutica.
Outro ponto de extrema importância é que a solicitação de retirada da cannabis da lista de plantas de interesse da indústria farmacêutica vai contra uma tendência mundial. Diversas empresas farmacêuticas já fabricam remédios à base de cannabis, com diversas concentrações de CDB e THC e resultados promissores. Além disso, diversos países do mundo já regulamentaram ou estão em vias de regulamentar a cannabis para fins medicinais. Assim, ao fazer tal solicitação, o CFM e a ABP parecem ignorar o que vem acontecendo em todo o mundo e vão na contramão da história.
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