ARTRITES (Reumatoides, osteoartrtites, gota, piogênica, séptica, psotiática, espondilite anquilosante)

As artrites são inflamações das articulações produzidas por diversos motivos. Suas origens são pouco conhecidas. No entanto, todas elas envolvem fatores genéticos, orgânicos, ocupacionais e ambientais. Atingem uma em cada sete pessoas acima dos 30 anos, das quais 60 a 70% são mulheres. Elas são mais comuns em adultos e idosos e têm aumentado muito ultimamente, com o sedentarismo e o envelhecimento da população, já sendo um dos principais distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho. Quando não controladas, progridem e levam a lesões que atrofiam e dificultam os movimentos dos membros, principalmente mãos e dedos. Pode haver rigidez, torção e deformidade das partes envolvidas, o que compromete a realização de atividades diárias simples se tornando incapacitante em muitos casos. O tratamento esta relacionado com o controle da causa principal e o uso de antibióticos, quando necessários, anti-inflamatórios e corticoides são de uso frequente.

Os receptores canabinoides CB1 e CB2 estão diretamente relacionados à inflamação crônica e foram detectados em várias células do sistema imune.  A inflamação crónica da artrite reumatoide é acompanhada por ativação do sistema nervoso autônomo simpático, que modula o sistema imunológico para perpetuar a inflamação. Vários modelos animais de artrite demonstraram que a noradrenalina periférica, substância reguladora do processo inflamatório, é liberada nas terminações sinápticas periféricas e controlada pelo receptor CB1 [1]. Estudo realizado no Department of Musculoskeletal Biology, Institute of Ageing and Chronic Disease, University of Liverpool, UK identificou que ativação destes receptores por canabinoides pode diminuir o processo inflamatório crônico. Por outro lado, os receptores CB2, presentes nas células mononucleares do sistema imunológico (linfócitos e macrófagos) e também nas células do tecido sinovial das articulações, quando ligados a um agonista canabinoide promovem redução da inflamação e inibem a síntese dos osteoclastos, células que corroem os ossos, se tornando um alvo novo para tratamento das artrites crônicas [2].

Ação dos canabinoides e receptores CB1 e CB2 no processo inflamatório nas articulações [PubMed] http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4289380/pdf/12891_2014_Article_2353.pdf

Ação dos canabinoides e receptores CB1 e CB2 no processo inflamatório nas articulações [PubMed]

Os canabinoides têm múltiplas ações na membrana sinovial, que se constitui fina camada de tecido conjuntivo ricamente vascularizado e inervado que envolve as articulações, que sofre processo de inflamação intensa na artrite reumatoide e na osteoartrite. As células sinoviais, fibroblastos, estão relacionadas com a produção do líquido sinovial e processos anti-inflamatórios das articulações. A inflamação é modulada pelas citocinas, proteínas produzidas por diversas células, principalmente linfócitos e macrófagos ativados, e pelos próprios fibroblastos. O conjunto de ações, desencadeadas pela intrincada rede de citocinas, produz resposta imune fisiológica e/ou patológica.

Os receptores CB2 são mais expressos na membrana sinovial de pacientes com artrite reumatoide do que na osteoartrite. A produção de citocinas específicas (CCL2, MMP-3 e IL-6) pelos fibroblastos foi suprimida após tratamento com agonista canabinoide CB2 específico. Essa ação determinou redução dos monócitos e da osteoclastogênese (produção de osteoclastos) fatores inflamatórios importantes na artrite reumatoide [2].

 

Outro mecanismo de ação dos agonistas de receptores CB2, também presentes em terminações nervosas aferentes do tecido sinovial, está relacionado ao potencial bloqueio do nociceptor TRPV1, receptor sensorial de estímulo doloroso. Tanto o THC quanto o CBD podem ser úteis para o controle e alívio dos sintomas da artrite crônica. Estes fatos também observados por pesquisadores da Universidade Médica e Odontológica de Tóquio, conforme estudo publicado em 2014, que puderam documentar a melhora do quadro articular, por RX em patas traseiras de ratinhos de laboratório, após 21 dias consecutivos de tratamento realizado através de 4 injeções intraperitoneais diárias contendo 4 mg / kg de peso de JWH133, um agonista canabinoide do receptor CB2 identico ao canabidiol CBD[3].

As setas apontam a ação osteoclástica nos ossos periarticulares, é possível observar a destruição óssea induzida pela artrite e a preservação, das mesmas articulações, após tratamento com agonista canabinoide em modelo experimental. [PuBMed] http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4243420/pdf/12891_2013_Article_2224.pdf

As setas apontam a ação osteoclástica nos ossos periarticulares, é possível observar a destruição óssea induzida pela artrite e a preservação, das mesmas articulações, após tratamento com agonista canabinoide em modelo experimental. [PuBMed]

A cannabis medicinal está sendo cada vez mais usada no tratamento de doenças reumáticas porque, apesar da escassez de evidências sobre sua segurança e eficácia, um número crescente de países está legalizando seu uso para fins médicos em resposta à pressão social. Os canabinoides podem ser úteis no tratamento de doenças reumáticas por duas razões amplas: sua atividade antiinflamatória e imunomoduladora e seus efeitos sobre a dor e sintomas associados [4,5].

Opinião AMA+ME

A incidência de processos inflamatórios das articulações, que estão relacionados a várias condições patológicas, é relevante e determina importante prejuízo para o indivíduo e para a sociedade como um todo uma vez que, para casos avançados, induz invalidez precoce limitando a força de trabalho. Muito ainda precisa ser esclarecido, mas é inegável o benefício dos canabinoides nos processos inflamatórios articulares. O uso de um extrato canábico rico em CBD, ou mesmo um extrato canábico contendo proporção equilibrada de THC, produzido a partir de um cultivo regional ou local que garanta a continuidade do tratamento, pode melhorar muito a sintomatologia e, consequentemente, a vida de pacientes com artrites crônicas, muitas vezes, incapacitantes.

Assim como na oncologia, ainda faltam estudos clínicos para desenvolvimento de protocolos para uso, herbáceo ou farmacológico, mais adequado para cada doença de origem autoimune e para cada paciente específico. Questões sociais, proibicionistas ou não, conceitos e pré-conceitos, não podem estar acima do alívio para o sofrimento. Existem inúmeras maneiras de se beneficiar com cannabis medicinal, desde “in natura”, obtidas a partir de espécies distintas (“strains”), até preparações farmacológicas. Para casos específicos, a orientação médica é fundamental.

Referências

  1. Lowin T, Straub RH. Cannabinoid-based drugs targeting CB1 and TRPV1, the sympathetic nervous system, and arthritis. Arthritis Res Ther. 2015 Sep 6;17:226.[PubMed]
  2. Staunton CA, Mobasheri A and Jolley RB. High hopes for cannabinoid agonists in the treatment of rheumatic diseases. BMC Musculoskeletal Disorders 2014, 15:410. [PubMed]
  3. Fukuda S, Kohsaka H, Takayasu A, et al. Cannabinoid receptor 2 as a potential therapeutic target in rheumatoid arthritis. BMC Musculoskeletal Disorders 2014, 15:275. [PubMedSarzi-
  4. Puttini P, Ablin J, Trabelsi A, et al. Cannabinoids in the treatment of rheumatic diseases: Pros and cons. Autoimmun Rev. 2019 Dec;18(12):102409. [PubMed]
  5. Lowin T, Schneider M, Pongratz G. Joints for joints: cannabinoids in the treatment of rheumatoid arthritis. Curr Opin Rheumatol. 2019 May;31(3):271-278. [PubMed]